“Muita gente acha que somos vagabundos e que só queremos andar de skate, mas ninguém vê a nossa dedicação. Espero que isso mude um dia”. O desabafo do pentacampeão brasileiro e campeão sul-americano de mountainboard Thiago Solon, de 19 anos, resume bem o que é praticar modalidades radicais no país. Como é de praxe quando o assunto é o esporte nacional, a principal indignação dos jovens atletas é em relação à falta de patrocinadores e à visão preconceituosa de boa parte das pessoas. “No Brasil, se o esporte não é olímpico, não é bem visto”, reclama. Foto: Gustavo Wittich
O mountainboard se encaixa perfeitamente na definição de esporte radical. Em cima de um board, plataforma semelhante ao skate, os atletas descem em alta velocidade montanhas irregulares de terra ou, dependendo da modalidade, realizam arriscadas manobras no ar, que vão de giros até saltos em que chegam a tirar os dois pés da prancha. Apesar de ainda ter...
estrutura relativamente amadora, o esporte vem se desenvolvendo. O maior complexo de pistas do país, localizado em Visconde de Mauá, no Rio de Janeiro, recebeu no início deste mês a mais antiga e completa etapa do circuito brasileiro, que reúne todos os quatro estilos existentes.Leia mais:
Big Air, Boardercross, Freestyle... hã?
O Downhill, que na tradução livre seria morro abaixo, é aquele em que quem realiza a descida de maneira mais rápida vence. O boardercross funciona de forma parecida, mas três competidores passam pelo percurso ao mesmo tempo. O Big Air, que costuma impressionar o público, dá ao atleta o direito de percorrer cinco vezes a pista enquanto realiza manobras de seu repertório. O último estilo, freestyle, desafia os competidores a andarem pelo circuito explorando obstáculos como corrimão, rampas, quarter, entre outros. “Nessa modalidade o importante é o aproveitamento da pista e a criatividade”, explica Thiago.
Competindo literalmente em casa, já que seu pai é responsável pelas pistas de Visconde de Mauá, o garoto venceu nos estilos Big Air, boardercross e freestyle noturno. Sair vitorioso em três das quatro modalidades deixou Thiago satisfeito. “O resultado superou minhas expectativas, já que o nível da galera aumenta bastante a cada ano”. Perder no downhill não abala o jovem, que aponta o vencedor, seu amigo Tupac Bitencourt, também de 19 anos, como o mais veloz do Brasil.
Foto: Gustavo WittichAmpliar
Tupac Bitencourt, 19, foi o vencedor da etapa brasileira no estilo downhill
Com o tempo de 32s25 cravado no cronômetro, Tupac abocanhou mais um título para o vasto currículo de conquistas, que começaram em 2008. “Independente do resultado, é muito gratificante estar com toda a galera”, afirma de forma humilde. Os garotos, que ainda apontam o gaúcho Alex Lâmpada como outro grande nome, têm a sorte de contar com uma das melhores estruturas de treinamento do país, a da escolinha Local Trip, mantida pela família de Thiago.
Paulo Solon, aos 53 anos, orgulha-se não só de ainda praticar e ver seu filho conseguir tantas vitórias, mas também de ser o responsável por trazer o mountainboard ao Brasil. O esporte surgiu em 1996 nos Estados Unidos por meio de praticantes do snowboard, que, por ficarem dois terços do ano sem neve, tiveram a ideia de fazer uma adaptação para as montanhas. Paulo soube da novidade após uma viagem do irmão, e como surfista morador das colinas, percebeu ter encontrado a solução para não ficar longe das atividades físicas.
Atualmente, ele mantém em sua escolinha equipes nas categorias pró-elite (da qual Thiago e Tupac fazem parte), amador, master – para quem tem mais de 32 anos – e feminino. O conselho principal que ele dá para quem quer praticar é: “sempre use todas as proteções básicas e procure orientação com instrutores experientes e capacitados para começar com segurança”. Não existe idade para o mountainboard, mas o equipamento ideal muda conforme altura e peso do atleta, categoria que pratica e estilo do terreno. “De 10 em 10 cm de altura e de 10 em 10 quilos, deve-se redimensionar o comprimento, a largura e o grau de dureza do shape”, alerta Paulo.
Foto: Cauã Csik
Paulo Solon, 53, responsável pela vinda do montainboard ao Brasil
Segurança em primeiro lugar
Tupac e Thiago não possuem rotina pesada de treinamentos, eles praticam, quando dá, cerca de duas vezes por semana após as aulas. Mesmo assim, alertam para a necessidade de usar todo o aparato de segurança e seguir orientações de pessoas com mais experiência. Mesmo com todo cuidado, Thiago já sentiu na pele o que um acidente pode causar. Ao tentar executar uma manobra chamada 360º tail grab, seu pé escapou e como resultado da queda teve que colocar dois pinos no ombro. “Como todo esporte, o mountainboard tem seus riscos, por isso é necessário usar capacete, joelheira, cotoveleiras e luvas”, recomenda ao contar que realiza manobras ainda mais radicais, como o 720º.
Foto: Gustavo Wittich
“Como todo esporte, o mountainboard tem seus riscos", explica Thiago Solon
Entretanto, para começar no mountainboard não é preciso ter experiência em nenhum outro esporte, como skate ou surfe. Existem atletas de alto nível que nunca praticaram nada sobre prancha, como é o caso do norte-americano Kody Stewart, que consegue realizar a manobra 1080º. O Brasil ainda tem poucos atletas, são cerca de 60, por isso há muito espaço para o surgimento de novos nomes.
O diretor da Associação de mountainboard do Rio de Janeiro, Fernando Gazzola, 30 anos, conta que o esporte não é perigoso e, assim como os demais, recomenda que se busque orientação específica. “É preciso ter bom senso para não descer em ladeiras íngremes antes de aprender conceitos básicos como frear e tirar os pés das alças, além de se proteger com os equipamentos”. Ele diz também que como o mountainboard pode ser praticado em diversos terrenos, o ideal é que o iniciante comece praticando na grama, para só depois utilizar outras superfícies. “Os atletas treinam em piscinas de espuma e só depois, quando a manobra está perfeita, passam a executá-la na terra”.
No fim das contas, além de esporte, o mountainboard acaba sendo a terapia desses garotos, que aprendem ainda conceitos como amizade, companheirismo e a importância de praticar atividades físicas. “É uma sensação de liberdade, uma forma de me expressar e interagir com os amigos. Quando subo no drop, esqueço dos problemas e só penso na próxima manobra”, conta Thiago. “É uma mistura de adrenalina, sintonia com a natureza, e interação com outras pessoas”, completa Tupac.
Fonte: www.ig.com.br
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